Esta dica é em especial para o Alexandre.
Se tem um livro que eu gosto do García Márquez e que eu acho que foi muito bem escrito, meticulosamente escrito, é "El otoño del patriarca". É um romance que a gente tem que ler várias vezes, a vida inteira.
"Durante el fin de semana los gallinazos se metieron por los balcones de la casa presidencial, destrozaron a picotazos las mallas de alambre de las ventanas y removieron con sus alas el tiempo estancado en el interior, y en la madrugada del lunes la ciudade despertó de su letargo de siglos con una tibia y tierna brisa de muerto grande y de podrida grandeza. Sólo entonces nos atrevimos a entrar sin embestir los carcomidos muros de piedra fortificada, como querían los más resueltos, ni desquiciar con yuntas de bueyes la entrada principal, como otros poponían, pues bastó con que alguien los empujara para que cedieran en sus goznes los portones blindados que en los tiempos heroicos de la casa habían resistido a las lombardas de William Dampier."
Em tradução de Remy Gorga Filho:
"Durante o fim de semana, os urubus meterem-se pelas sacadas do palácio presidencial, destroçaram a bicadas as malhas de arame das janelas e espantaram com suas asas o tempo parado no interior, e na madrugada da segunda-feira a cidade despertou de sua letargia de séculos com uma morna e terna brisa de morto grande e de apodrecida grandeza. Só então nos atrevemos a entrar sem investir contra os carcomidos muros de pedra fortificada, como queriam os mais decididos, nem arrombar com juntas de bois a entrada principal, como outros propunham, pois bastou que alguém os empurrasse para que cedessem em seus gonzos os portões blindados que nos tempos heróicos da casa haviam resistido aos canhões de William Dampier."
Na orelha escrita pelo tradutor, podemos ler:
"Toda a fauna que povoa estas 260 páginas, nada disto é tão fantástico e tão real (ao mesmo tempo) quanto a triste e solitária figura do Patriarca, um homem que tem uma idade indefinida ente os 107 e os 232 anos. Perdido nas troneiras da memória, dono de muitas vidas e muitas mortes, dele não se viam mais que os tristes olhos, os lábios pálidos, a mão pensativa dando adeusinhos. Como todo ditador, distante da realidade do seu povo, mal-informado, erra nas decisões, mas decide sempre no sentido de afirmar seu poder e de se perpetuar."
31 de março de 2008
29 de março de 2008
21 de março de 2008
20 de março de 2008
Primeiro o autor: Andrei Kurkov nasceu em 1961, na Ucrânica. É escritor, jornalista e roteirista. Autor de treze romances e novelas, cinco livros infantis e mais de vinte roteiros para filmes e documentários cinematográficos, foi editor da revista Dnipro. Na imprensa européia, é conhecido por retratar por um um viés ácido e com toques de nonsense o cotidiano colapsado de uma sociedade pós-União Soviética.
É o que se lê nas orelhas do livro "A morte de um estranho", lançado aqui no Brasil pela editora "A girafa", em 2006, traduzido do russo por Nivaldo Santos. O autor é best-seller, seu romance "Piquenique no gelo" vendeu mais de 150 mil exemplares. Mas isso não quer dizer nada. O livro "A morte de um estranho" é bom, é excelente, tem um humor sarcástico, bastante irônico. A trama é interessantíssima, eu recomendo.
Vai um trecho aí logo do início do romance:
"Noite. Cozinha. Escuridão. Simplesmente desligaram a eletricidade e a luz apagou. Na escuridão ouviam-se os passos do pingüim Micha; ele aparecera na casa de Viktor um ano atrás, no outono, quando o zoológico distribuíra animais famintos a todos que pudessem sustentá-los. Então Viktor pegara um pingüim real. Exatamente uma semana antes disso, sua namorada o havia deixado. Ele ficara sozinho, e o pingüim Micha trouxera consigo a sua própria solidão; agora, os dois solitários simplesmente completavam um ao outro, criando a impressão mais de interdependência do que de amizade."
É o que se lê nas orelhas do livro "A morte de um estranho", lançado aqui no Brasil pela editora "A girafa", em 2006, traduzido do russo por Nivaldo Santos. O autor é best-seller, seu romance "Piquenique no gelo" vendeu mais de 150 mil exemplares. Mas isso não quer dizer nada. O livro "A morte de um estranho" é bom, é excelente, tem um humor sarcástico, bastante irônico. A trama é interessantíssima, eu recomendo.
Vai um trecho aí logo do início do romance:
"Noite. Cozinha. Escuridão. Simplesmente desligaram a eletricidade e a luz apagou. Na escuridão ouviam-se os passos do pingüim Micha; ele aparecera na casa de Viktor um ano atrás, no outono, quando o zoológico distribuíra animais famintos a todos que pudessem sustentá-los. Então Viktor pegara um pingüim real. Exatamente uma semana antes disso, sua namorada o havia deixado. Ele ficara sozinho, e o pingüim Micha trouxera consigo a sua própria solidão; agora, os dois solitários simplesmente completavam um ao outro, criando a impressão mais de interdependência do que de amizade."
10 de março de 2008
Nas orelhas do livro "O jovem Törless", de Robert Musil, editado em 1982 pela Editora Nova Fronteira, com tradução de Lya Luft, podemos ler:
"O jovem Törless (Die Verwirrungen des Zöglings Törless - As perturbações do aluno Törless) é o primeiro romance de Robert Musil. Lançado em 1906, nele já estão presentes as audaciosas análises psicológicas que logo depois se tornariam características do expressionismo alemão. Trata-se de um estudo da adolescência no qul Musil coloca sua própria experiência como ex-aluno de um colégio militar austríaco, e onde a matéria e a forma quase se retraem em favor da penetração poética na 'alma' dos personagens.
Além disso, com três décadas de antecedência, a história do jovem Törless pode se lida - e sobretudo pensada - como uma antecipação do nazismo e suas motivações psicológicas baseadas na violentação do indivíduo pelo sistema."
Assim, seleciono um trecho do romance:
"Pensou nos antigos quadros que vira em museus, sem entendê-los bem. Esperava alguma coisa, como sempre esperara diante daquelas pinturas... Algo que jamais acontecia... O quê? Algo surpreendente, jamais visto; uma visão monstruosa, da qual não tinha a menor idéia; uma terrível sensualidade animal, que o pegasse pelas unhas e o dilacerasse, começando pelos olhos; uma experiência que... devesse se ligar... de uma forma ainda muito imprecisa... aos vestidos sujos das mulheres, com suas mãos grossas e a miséria dos seus quartinhos, com a lama dos quintais... Não, não; não é tão ruim como as palavras o fazem parecer; é algo mudo... um nó na garganta... um pensamento quase imperceptível, que só brota quando a todo custo se quer dizê-lo em palavras; mas então seria parecido apenas de longe, como algo imensamente aumentado, onde não somente se vê tudo mais nítido, mas também se percebem coisas que sequer existem... Ainda assim, aquilo o envergonhava."
"O jovem Törless (Die Verwirrungen des Zöglings Törless - As perturbações do aluno Törless) é o primeiro romance de Robert Musil. Lançado em 1906, nele já estão presentes as audaciosas análises psicológicas que logo depois se tornariam características do expressionismo alemão. Trata-se de um estudo da adolescência no qul Musil coloca sua própria experiência como ex-aluno de um colégio militar austríaco, e onde a matéria e a forma quase se retraem em favor da penetração poética na 'alma' dos personagens.
Além disso, com três décadas de antecedência, a história do jovem Törless pode se lida - e sobretudo pensada - como uma antecipação do nazismo e suas motivações psicológicas baseadas na violentação do indivíduo pelo sistema."
Assim, seleciono um trecho do romance:
"Pensou nos antigos quadros que vira em museus, sem entendê-los bem. Esperava alguma coisa, como sempre esperara diante daquelas pinturas... Algo que jamais acontecia... O quê? Algo surpreendente, jamais visto; uma visão monstruosa, da qual não tinha a menor idéia; uma terrível sensualidade animal, que o pegasse pelas unhas e o dilacerasse, começando pelos olhos; uma experiência que... devesse se ligar... de uma forma ainda muito imprecisa... aos vestidos sujos das mulheres, com suas mãos grossas e a miséria dos seus quartinhos, com a lama dos quintais... Não, não; não é tão ruim como as palavras o fazem parecer; é algo mudo... um nó na garganta... um pensamento quase imperceptível, que só brota quando a todo custo se quer dizê-lo em palavras; mas então seria parecido apenas de longe, como algo imensamente aumentado, onde não somente se vê tudo mais nítido, mas também se percebem coisas que sequer existem... Ainda assim, aquilo o envergonhava."
1 de março de 2008
Um motim de açucenas, um albergue
de peixes, uma espada
(se te moves) um largo meridiano
de painas e centelhas apresadas.
Um fio para que cantes, um silêncio
de mão jogada ao fruto, um vago, um livre
passeio de tendões rumo a si mesmos.
Ah, se te moves, que não buscas nada,
que não conquistas, colhes ou retomas,
que és tu, lançado e frio, êste motim
que imagino e alimento, contra mim.
Assim se inicia o livro "Cantata", de Walmir Ayala, Prêmio Olavo Bilac da Secretaria de Educação e Cultura do Rio de Janeiro em 1961. A comissão que julgou o certame foi composta por Manuel Bandeira, Ledo Ivo e Carlos Drummond de Andrade. Ayala nasceu em Porto Alegre, RS, em 1931 e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 1991.
de peixes, uma espada
(se te moves) um largo meridiano
de painas e centelhas apresadas.
Um fio para que cantes, um silêncio
de mão jogada ao fruto, um vago, um livre
passeio de tendões rumo a si mesmos.
Ah, se te moves, que não buscas nada,
que não conquistas, colhes ou retomas,
que és tu, lançado e frio, êste motim
que imagino e alimento, contra mim.
Assim se inicia o livro "Cantata", de Walmir Ayala, Prêmio Olavo Bilac da Secretaria de Educação e Cultura do Rio de Janeiro em 1961. A comissão que julgou o certame foi composta por Manuel Bandeira, Ledo Ivo e Carlos Drummond de Andrade. Ayala nasceu em Porto Alegre, RS, em 1931 e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 1991.
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