22 de julho de 2006

Também fazemos números de circo sabe, daqueles números de transmissão de pensamento, magias e outros mistérios. Curioso, diz Vicente, pensei que fossem mais sérios, mais do tipo religioso. Não há diferença diz Valentim-Valdemar, religião e circo têm estado muito iguais. Nos últimos anos, sim, não só, já de há muitos anos, as pessoas esperam maravilhas fáceis de um lado e do outro, esperam uma leve suspeita de que existem outras realidades sem terem de se incomodar a aprofundar o assunto, esperam que tudo se resolva, que as pontes salvadoras sejam estabelecidas, que os tributos sejam pagos, com aplausos e esmolas. Compram o bilhete para, um dia, irem para um céu qualquer. Como quem vai ao circo, entendo, diz Vicente, e no circo, além dos seus prodígios, o senhor discursa? O menos possível, demonstro o mais que posso porque a palavra está muito gasta, tão desvalorizada quanto o dinheiro, os políticos inflacionaram tudo, as pessoas não conseguem aproveitar mais do que uma ou duas palavras numa frase de vinte ou trinta, é um valor muito baixo, quero dizer, muita palavra para pouco aproveitamento.

Trecho de "O chão salgado", de Maria Isabel Barreno.

2 comentários:

Claudio Eugenio Luz disse...

Meu caro, a minha ignorância é gritante; corro atrás.

hábraços

whisner disse...

é uma grande escritora a maria, não vai se arrepender. abrações.