14 de dezembro de 2005

Dizem que nas grandes cidades não há o tipo ingênuo, a inocência... A inocência é uma propriedade, uma qualidade que passa, mas existe em toda a parte. Nas classes mais pobres, nos meios mais miseráveis é que se encontra mais a flor da inocência, exposta ao vendaval e guardando o perfume, por um prodígio. Desfolhar essa flor, violentamente, como um sátiro; não é crime - é instinto. Gozá-la naturalmente sem a intenção senão de gozar - é a natureza. Cercá-la, prendê-la, ir aos poucos aspirando-a, desfolhando pétala por pétala, com refinamento, intenção dupla, consciente e feroz - é que é monstruoso. E vocês não sabem, não podem imaginar a fúria de caçador que eu desenvolvo para as encontrar, vocês não concebem o gozo meu ao prelibar a volúpia de um beijo de virgem, um beijo sugado na boca ainda não beijada...

João do Rio (1881 - 1921), no conto "O monstro".

2 comentários:

Claudio Eugenio Luz disse...

Em tempos puritanos, conservador, João do Rio ainda é pedra no sapato.
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hábraços,claudio

whisner disse...

é impressionante, não? mas joão do rio anda meio esquecido...