Marta permaneceu no cais vendo o navio afastar-se lentamente, até não mais distinguir a fisionomia de sua mãe quebrada por um pranto súbido, irrompido no derradeiro instante da despedida, como se apenas nesse momento ela se tivesse dado conta de uma realidade que, embora preexistindo, só agora divisava claramente. Em pouco sua silhueta se foi apagando, confundindo-se com as manchas de cor dos vultos de outros viajantes, depois já não se vendo senão o bojo do navio, até que também este começou a diminuir, à medida em que acelerava a marcha em demanda à barra.
As pessoas que se aglomeravam no porto foram cedendo à lassidão do cansaço, dispersando-se vagarosamente debaixo do sol de meio-dia entre debilmente chorosas e secretamente aliviadas da prolongada tensão da despedida, recobrando a consiência da inutilidade de continuarem acenando com os lenços no ar, sentindo-se elas próprias quais trapos moles e pendentes.
Parágrafos iniciais do romance "O muro de pedras", de Elisa Lispector, Prêmio José Lins do Rego, da Livraria José Olympio Editora, em 1963; Prêmio Coelho Neto, da Academia Brasileira de Letras, em 1946.
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