29 de janeiro de 2012

Incompleto movimento, de Alberto Bresciani



Alberto Bresciani resolveu lançar seu primeiro livro aos cinquenta anos. É fato interessante, claro. Não sei se deveria ter editado antes, só posso comentar o que tenho em mãos. E tenho um livro consistente, de um poeta seguro, tarimbado. Demorei três meses, fiz quatro leituras da obra. Claro que um poema e outro me agradaram mais e estes li outras vezes. Após a primeira leitura, escrevi uma mensagem para o Bresciani contando que, após ler livros como este, tenho vontade de aposentar a caneta. Acho que isso não é coisa que se diz, mas estou sendo honesto. Saio deprimido de uma obra assim, porque eu queria ter esse domínio da linguagem.
O que vou escrever aqui não é novidade. Eu carrego um caderno por onde vou - nele anoto palavras, pensamentos, reflexões, ideias. Tenho rabiscadas observações sobre quase todos os livros que li. Os que valem a pena, lógico. Quando se trata de um livro de versos, registro as palavras que mais aparecem. Nesta antologia do Bresciani, não tenho dúvidas, três palavras se repetem o tempo todo, mas nenhuma como a "pele". Assim é que eu imagino que o escritor nos dá uma dica de como ler sua obra.
Como o autor separa as cento e dez páginas da coletânea em quatro partes: "Dos gestos que transfiguram", "Dos gestos que iluminam", "Dos gestos que atordoam" e "Dos gestos que paralisam", pude ter uma ideia geral da construção que ele arquitetou.
Juntemos o gesto à pele, qual o resultado? Relacionamentos. Quando observamos, nos relacionamos. Como enxergar o que existe, como, como observadores, como interventores, agimos no mundo, modificando-o, interpretando-o? Talvez Bresciani tenha tentado não responder estas questões, mas refletir sobre elas. Abro agora o livro ao acaso, escolho um título de um poema, "Idioma" e  lá está:

Nestes signos
a reinscrição do talvez
sopro que não morde

só se escreve no ar
os olhos quase podem ver
e, quem sabe, um dia desvelar

Assim segue o desejo, quase tangível. Um desejo amainado, vez ou outra por um gesto que captura uma esperança de compreensão, de descanso, como nos versos de "Cronologia":

nas mãos, entre os braços
no peito, na plenitude
dos pelos e da pele

à mira 
da boca, das garras, dos dentes

Há, para mim, um recado claro: a compreensão está sempre um passo adiante, nossa tarefa é, então, persegui-la. Aí vai o poema "Opostos":

A extensa via obriga
a mãos inversas

Nem a luz é toda
brilha por prismas

Em cada foco
a distância se amplia

Nada nos une
ou decifra.

Nenhum comentário: