8 de dezembro de 2008

Juan José Millás

Vocês conhecem Juan José Millás? Ele á apresentado assim na orelha de um de seus livros: "Referência do jornalismo literário, Juan José Millás (Valência, 1946) é um dos romancistas espanhóis mais importantes e aclamados pelo público e pela crítica tanto na Espanha quanto nos outros quinze paíese onde sua obra está traduzida."
Sugiro dele: Cerbero son las sombras e La soledad era esto. Ambos são difíceis de achar aqui no Brasil. Não sei se foram traduzidos.
Então talvez fosse mais fácil se procurassem o "Laura e Julio", um livro bem interessante. O resumo da trama eu transcrevo da orelha da obra:
"Laura e Julio é um romance sobre a ausência. O jovem casal que dá título ao livro tem uma vida vazia, sem trocas, seja de palavras ou de afeto. Laura e Julio praticamente só conversam quando Manuel os visita. Novo morador do prédio, Manuel é um escritor que jamais escreveu um livro e que prefere vivenciar a história de Laura e Julio a colocá-la no papel. Para ele, os dois mais parecem personagens de ficção; não da vida real. Mas Manuel sofre um acidente que condena ao isolamento não apenas ele mesmo, mas também a dupla. E o inevitável finalmente acontece: laura pede a separação. Sem rumo, Julio refugia-se na casa desocupada do vizinho. O apartamento serve como uma espécie de vitrine por meio da qual passa a espionar a vida da ex-mulher, assim como Manuel deveria fazer quando morava ali. Pouco a pouco, Julio vai se apropriando dos objetos do vizinho e até de sua persona. Durante essa transformação, descobre que não é o único a viver uma mentira."

Um trecho aí do romance:

"Julio apagou a luz e sentou-se na cama, junto à cabeceira da menina, com quem trocou, já na penumbra, um olhar que o perturbou.
- Se quiser que eu durma, vai teer que me contar uma história - disse a menina.
- Eu não sei contar histórias - disse Julio.
- Então não vou dormir.
O adulto e a pequena permaneceram em silêncio alguns instantes, cada um à espera de que o outro resolvesse a situação. Finalmente, a menina cedeu.
- Você diz era uma vez e vai ver como sai sozinho.
- Era uma vez - disse Julio, e calou-se.
- Era uma vez um país - acrescentou a menina.
- Era uma vez um país...
Nesse instante, uma sombra causada por alguma atividade que vinha da rua atravessou a parede.
- Era um país - repetiu Julio - onde havia menos sombras que pessoas.
- Por quê?
- Porque a metade das pessoas nascia sem sombra.
- E como eram as pessoas sem sombra?
- Atordoadas.
- O que quer dizer atordoadas?
- Que pensavam pouco nas coisas.
- Que coisas?
- Todas as coisas. Prendiam os dedos nas portas; caíam pelas escadas; cortavam-se com as tesouras; queimavam-se com a sopa; engasgavam com a comida; deixavam as torneiras abertas e os cadarços dos sapatos desamarrados...
- Faziam xixi na cama?
- Também.
- Sabiam ler?
- Mal.
- E o que aconteceu?
- O governo desse país decidiu dividir as sombras existentes ao meio e distribuí-las entre os cidadãos para que todos tivessem pelo menos meia sombra."

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